Na missa de sétimo dia por meu pai, hoje de manhã, disse umas palavras sobre ele, que muitos vieram me perguntar se eu iria publicar em algum lugar. Bem, então, o lugar será este. Quem foi à missa, pode pular este pedaço…
Meu pai, Domingos Giobbi, foi um homem único, e ao mesmo tempo múltiplo. Cada um de vocês conheceu um pedaço dele, o engenheiro, o músico, o colecionador de arte brasileira, o esportista do mar e das montanhas, o ser social educado e elegante, com uma prosa solta, ótimo dançarino. Meu pai, na verdade, era tudo isso e mais. Ficou claro, no seu enterro, na profunda emoção de pessoas que eu nem conhecia. E em algumas das mais de 1.500 manifestações no facebook, fora Instagram, e-mails, telegramas, telefonemas. Muitos afirmaram que conhecer e conviver com meu pai mudou suas vidas, de alguma maneira.
Meu pai tinha profundo conhecimento e um imenso entusiasmo por tudo o que lhe interessava. E tinha um irresistível poder de sedução. A meu ver, são esses os três atributos dos grandes líderes e, sobretudo, dos grandes mestres. Ele falava como um mestre. Ouvi-lo era um prazer e um aprendizado.
Em família, tinha um temperamento explosivo, que muitas vezes dificultou o convívio com os próximos. Mas isso era compensado com grandes doses de carinho e simpatia. Ele foi especialmente um bom pai na atenção que deu à nossa formação e no apoio que deu às nossas escolhas. Sobretudo as minhas, bastante heterodoxas numa família de engenheiros conservadores. Foi extremamente preocupado e atento com minha irmã, de quem cuidou até este ano. Tinha paixão pelos três netos, no que era totalmente correspondido. E teve dois casamentos felizes, com minha mãe, Vera, falecida há muitos anos, e com Adriana, que o cobriu de mimos e carinhos até o fim. Tinha especial afeição pela Helo, minha cunhada, casada com meu irmão há 40 anos, e pelo Paulo, meu parceiro há quase 35 anos. E pelos enteados Domitila e Marco Bonomi.
Com a idade, tinha virado um sábio sereno. Disse-me várias vezes que sua velhice era ótima, que não tinha problemas nem com seu passado nem com seu presente, e que era muito feliz. E quando, em 2010, a Estação Pinacoteca fez a exposição de sua coleção, eu preocupado que a emoção fosse demais para ele, aliviou minha aflição dizendo: “Meu filho, é a última cena”. De certa maneira, foi mesmo.
No fim da missa, vocês ouvirão músicas de montanha, cantadas por coros alpinos italianos, que meu pai adorava. Quando crianças, cantávamos algumas delas em família num coro de três vozes. Essas músicas falam de amor e morte, de guerra e patriotismo, sobretudo de italianidade. Nascido em São Paulo, meu pai sempre se considerou italiano.
Para terminar, quero ler para vocês um poema escrito por minha prima Adelina Aletti, que veio da Itália para se despedir de seu tio, composto horas antes dele falecer:
Bevo la tua morte
Nell’affanno del respiro
Nelle dita oggi gonfie
Di músico e scalatore.
Le montagne accoglieranno
La tua anima e la
Neve brillerá preghiere
Nella notte di luna
Que assim seja, obrigado