Vivemos hoje numa sociedade que confunde o que é realmente segurança

E que exige das pessoas, certezas; falsas certezas, como rótulo de competência, aval de gabarito no plano profissional, assim como de personalidade forte na convivência e na atitude privada. O que tanto está dirigindo jovens ao auto-engano por medo de falhar ou não deter essa razão, que os leva a ser considerados eficientes diante daqueles que cobram essa postura.

O que faz com que a saudável suspeita seja sempre vista como fragilidade, erro de ação, até mesmo desvio de conduta. A tal ponto que ao usar a palavra “suspeita” em meu trabalho, ouvi de alguns: “Mude para incerteza, porque suspeita é uma palavra muito pesada e agressiva”.

Quando é exatamente suspeita o que se pretende nos questionamentos e dúvidas, no olhar inteligente que não fecha conclusões sobre o que será sempre inconclusivo: o homem, uma obra aberta como diz bem o escritor Umberto Ecco.

Os chamados filósofos da suspeita, o alemão Nietzsche talvez o que mais tenha ido direto na ferida, o francês Henri Bergson e o espanhol Ortega y Gasset, entre tantos outros, deram imensa contribuição à causa do comportamento e da consequente evolução, ao levantar questões fundamentais para desestabilizar mentiras ou créditos tênues que nada garantem. Palavras ao vento que a falsidade insiste em tornar frases de efeito e assim impressionar os incautos, os que se baseiam apenas em programas de qualidade, em receitas fechadas de como agir, em manuais de auto-ajuda que pretendem soluções e respostas comuns para o ser humano, que jamais é comum em seu conduzir-se.

Esse caminho é muito claro para mim e espero que para todos que se disponham a aprender a lição: no auge da minha insegurança, da baixa auto-estima, me escondia atrás de pífios conceitos, de afirmativas enfáticas, para disfarçar e me arrogar. À medida que fui ganhando um mínimo de segurança e de não mais precisar ficar provando isso ou aquilo, fui aceitando a suspeita, que deixou de ser tortura e fantasma e se tornou um caminho livre para o alcance da lucidez.

Sou tão solidário e carinhoso como me julgava? Nem tanto, provavelmente. Serei o melhor parceiro do mundo como já afirmei? “Que pretensão!”, gritou a voz do silêncio. A minha fé é inabalável? Ou é preciso sempre e sempre testá-la, nas horas boas e más, lembrou-me a consciência.

A compulsão da informação pelas redes sociais, a dificuldade em lidar com o sofrimento, essa absurda medicalização da tristeza que se vê hoje, as farsas que impedem os iniciantes de entender que o demais não é necessariamente o bastante, a confusão entre a dubiedade, o vacilar e a suposição, a saudável hipótese e principalmente o criar um discurso e acreditar nele – como vejo isso nas pessoas, gente! – são alguns dos fatores que nos levam a não bancar as dúvidas, de ter coragem de assumir a humildade de um “não sei”, “não tenho certeza” ou “é possível que você esteja certo e eu, não”.

Se tantos e tantos percebessem como é bom colocar-se como um ser vulnerável e bancar essa condição de “humano, demasiado humano”, como dizia o filósofo alemão, ganhariam um grande prêmio existencial, que compensa, em muito, cargos, status, elogios, dinheiro e aplausos: a leveza do viver.