O comportamento é muito comum e vejo, até com bastante humor, esse tipo de necessidade de auto-afirmação: pessoas que conseguiram emagrecer tudo o que têm direito adoram policiar os gordinhos que ainda se mantém rechonchudos (reparem que quando voltam a engordar nem mais tocam no assunto…); quem é disciplinado a ponto de freqüentar a academia todos os dias ou praticar um esporte regularmente, se torna tirano sobre os preguiçosos; os que param de fumar são os maiores críticos dos fumantes, assim como os abstêmios por ordem médica adoram registrar que não bebem mais uma gota de álcool. Isso é a clara e humana necessidade de auto-afirmação, o que, aliás, faz parte da condição humana. A afirmação é uma realidade dentro da fragilidade, da insegurança que nos compõe. Quando alguém me diz “fulano tem necessidade de auto-afirmação”, sempre rebato com a delicadeza possível “e por acaso, alguém sadio mentalmente e consciente de sua natureza, não o tem?”. Necessidade de auto-afirmação é a ânsia de ser referendado, de receber a validação que confirme uma proposta, uma tentativa de vitória, o resultado de algo pelo que se lutou. E que tem duas vias, o espelho que o outro nos dá e a nossa própria palavra de referência. Eis porque os que julgam ter alcançado, precisam exaltar a força de vontade e acabam pressionando quem surge à frente. Uma espécie de revanche pelo sacrifício feito. A comprovação está nos bons resultados obtidos por grupos de apoio, quer num regime alimentar, quer na busca de curar um vício; os tais depoimentos regulares, os sistemas de vigilância sobre as perdas e ganhos, acaba funcionando, porque se encontra ali a recompensa da tal validação, muito importante. O grande problema é que sem perceber que a insistência em querer que os amigos e conhecidos façam igual é muito mais uma tentativa de auto-afirmação do que uma ajuda ou um gesto de solidariedade, muitos se tornam chatos, dita-regras, desagradáveis reguladores da vida alheia. Ignorando as diferenças, as escolhas, a grande questão do comportamento: o que é bom para uns pode não o ser para os outros e que as dificuldades em superar são absolutamente diferentes de pessoa para pessoa. Alguns apelam para o afeto e assim clamam por nossa entrega, passando por cima de uma preciosa postura no relacionamento humano: o respeito à decisão de cada um de querer mudar ou não. Sem dúvida que há hábitos que podem encurtar a existência, prejudicar a saúde; também sem dúvida que as pessoas têm essa necessidade de se auto-afirmar, assim como é preciso crer na boa intenção e na amizade. Mas não se pode esquecer que certas pressões causam um mal muito maior: sem sedimentar e esclarecer os próprios sucessos e fracassos pessoais, é possível levar alguém a desprezar-se por se considerar um fraco que não consegue cuidar de si mesmo.

“Necessidade de auto-afirmação é a ânsia de ser referendado, de receber a validação que confirme uma proposta, uma tentativa de vitória, o resultado de algo pelo que se lutou. E que tem duas vias, o espelho que o outro nos dá e a nossa própria palavra de referência”

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