A inflexibilidade é um martírio que tira o prazer do cotidiano

Há certas frases ou expressões que o encontro com a maturidade – breve encontro, pois quem acha que já a encontrou definitivamente, ou a perdeu ou nunca esteve perto dela – vai mudando o peso, a dimensão, a veracidade. Quando jovens acreditamos piamente em colocações, como “para sempre”, “nunca mais”, “de uma vez por todas”, “minha vida acabou”, “jamais admitiria”. Até que o tempo, esse maravilhoso bálsamo e os resultados trágicos desse radicalismo, vão mostrando que não é bem assim.

O que se julgava para sempre, termina quando menos a gente espera, ainda que outros “para sempre” possam vir a surgir pelo caminho, porque a memória ainda é enganada pela paixão. O nunca mais assim como o “esta é a última vez” são enganados pelos nossos quadros mentais e as recaídas deixam de ser catalogadas por aquele ego maroto que eu penso que sou e que me desculpa tudo, rastreando justificativas as mais esfarrapadas para aquele cuspir para o alto.

Num dia, até rindo, descobre-se que não existe “o de uma vez por todas” e que o meio de campo embola justamente por isso em nossa condição demasiada humana. Que a vida não acaba porque fomos rejeitados por um amor que achávamos absoluto e único e nem porque alguém pseudoamigo nos puxou o tapete ou o patrão deu o bilhete azul e momentaneamente, não vemos saída. Eis que uma nova luz surge no fim do túnel e adeus vida acabada.

Talvez o mais difícil de aprender é que a inflexibilidade é um martírio que tira todo o prazer do cotidiano e custe um pouco para se eliminar do vocabulário o “jamais admitiria”. No meu caso, custou bastante. Lembro sempre de um tio querido e sábio que dizia calmamente para minha mãe diante das explosões de impaciência e intransigência, que ela como um ser da maleabilidade tinha dificuldade em lidar: “Deixa, um dia ele aprende”. E a gente aprende, muda e vai ficando docemente calejado.

Até para abrir a janela num domingo em que a praia era o programa e, vendo a chuva torrencial, dar uma boa risada e mudar o planejado. São as vantagens que a idade traz. Para alguns, bem entendido.

 

Foto: Stephen Wright/Wikimedia Commons