Tudo pode ser mais simples. Afinal, está diante da nossa janela

Cecília Meirelles, a poeta, diz lindamente “Mas, quando falo dessas pequenas felicidades certas/ que estão diante de cada janela/ uns dizem que essas coisas não existem/ outros, que só existem diante das minhas janelas/ e outros, finalmente, que é preciso aprender a olhar para poder vê-las”.

Realmente, tenho notado, até com uma certa regularidade, que muitas pessoas são incapazes de valorizar essas pequenas felicidades que surgem diante da nossa janela e que os franceses chamam de “petit bonheur”, tomando enorme cuidado em não perdê-las e, principalmente, em proporcionar aos próximos, quando possível (e olhe que eles são considerados frios e distantes). Talvez, por sonhar alto demais, quem sabe por esperar da vida mais do que ela pode nos dar. Pelo menos, naquela circunstância ou momento. Por não afiar a sensibilidade ou, até mesmo, por falta desse ensinamento numa família, na formação escolar. Há criações muito rígidas, concretas, racionais em excesso que acabam por ignorar as pequenas grandes coisas que nos fazem tão bem no dia-a-dia, já que as grandes chegam muito raramente.

Estou num momento da existência muito satisfatório por um lado e bastante carente pelo outro, em que essas minúsculas felicidades que acontecem diante da minha janela são preciosas, equilibram emoções, moderam humores, compensam desgastes e faltas afetivas. Se não chegam a cobrir uma ausência imensa ou o gesto de carinho diário dentro de casa, dão uma boa subida na balança dos vácuos emocionais e me deixam mais alegre, confiante, certo de que a vida é bonita, surpreendente e ampla.

A condição “sine qua non” é o estar alerta para captar. E esse estar alerta implica em eliminar a obsessão por determinadas metas, muitas delas inalcançáveis ou dependentes das decisões alheias. É preciso relaxar, abrir os olhos pela manhã e deixá-los vagar pelo quarto por alguns segundos, louvando aquela nova oportunidade diária, sem o exagero de achar que o simples acordar já é ser feliz porque não estou morto…isso é de um simplismo horrível, mas a chance de estando lúcido poder descobrir que mínimas atitudes das pessoas, como mandar um pedaço do doce que a gente adora, ligar só para saber como estamos sem razões específicas, uma caminhada no calçadão nessas manhãs lindas e frescas da semana que passou, fazem um bem enorme, renovam o movimento afetivo-nervoso, tocam a alma.

A poeta diz que alguns afirmam que é preciso aprender a olhar para poder ver. Pauto todo esse aprendizado no despojamento de teorias muito elaboradas, de conceitos arraigados e acima de tudo, de expectativas complexas e subliminares e exigências extremadas. Tudo pode ser mais simples. Afinal, está diante da nossa janela.