Tornar-se adulto é entender o que realmente vale a pena

Na carta manuscrita com uma caligrafia impecável, dessas que não se vê mais em tempos de web, um senhor de 74 anos coloca a sua “confissão de fracasso”, o que diz resumir sua decepção, embora eu não veja assim, de jeito nenhum.

Num relato emocionante, sensível e sutil, em que nem por uma palavra ou adjetivo ele acusa os filhos, apenas questiona sua possível falha como pai. “Que nada mais pretendia de seus quatro filhos do que homens humanistas, interessados, solidários, que enxergassem o mundo pela beleza filosófica e espiritual que propõe e mulheres que marcassem sua vida pelo entendimento do que é, realmente, ser mulher e ser mãe.”

E segue: “E que simbolizassem todo o encanto da figura feminina na mais absoluta simplicidade e, ao contrário, como mais uma vez constatei no almoço do meu aniversário em casa, no último domingo, por suas conversas e pretensões, por seus enfoques da existência e direcionamentos, que formei-os, junto com minha mulher, de forma totalmente diversa. Meus dois filhos homens só pensam em ganhar dinheiro, aumentar o status social e levar vantagens; seus papos variam do futebol para a bolsa de valores e os automóveis de último modelo. Minhas duas filhas, também casadas, como os rapazes, não me parecem as formadoras de novos clãs que são. Falam da academia, de roupas, de fofocas sociais; mostram-se irritadas com seus filhos pequenos e não sinto nelas, qualquer gesto sensível”.

O relato é longo e termina com aquela pergunta amarga que muitos pais de outras gerações ainda se fazem: “Aonde foi que eu errei?”.

Em nada, gostaria de dizer-lhe antes de tudo. Até porque os pais não podem se achar onipotentes e julgar que lhes cabe toda a responsabilidade pela formação dos filhos.

E onde ficam os 50% da individuação de cada um? No que nada tem a ver com o meio, as heranças genéticas e a cultura? Por outro lado, trata-se de um nítido confronto de valores, além da projeção natural que um pai tem sobre os filhos, esperando deles aquilo que julga o melhor. E, desculpe, nem sempre acertam.

É importante que esse senhor e outros tantos que possam estar vivendo uma circunstância familiar tão semelhante entendam que o mundo mudou, que as influências externas cresceram, que as escalas de valores se inverteram e que os apelos do consumismo são tão grandes que, na maioria das vezes, abafam as melhores intenções e os princípios de grandeza que englobam moral, ética e misticismo. Dos 37 aos 45 anos, justo a faixa etária desses quatro filhos, a pressão da mídia e do marketing é brutal.

Estou certo que um dia eles vão enxergar a vida de forma diferente e na entrada de novos patamares entenderão que maturidade é não dar mais o menor valor ao que não merece de nós qualquer consideração. Tornar-se adulto não é uma questão de idade, mas de entendimento do que realmente vale a pena e de quanto certas coisas que nos pareciam fundamentais se tornam supérfluas e pequenas. Pouco ou nada valoráveis.

Mas isso leva tempo e só a vida ensina.

Foto: Ivone Santos © I stop for photographs