Prestes a virar “coisa de museu”, mas no melhor e mais ativo sentido que se possa pensar, a tolerância (ou a falta de) é o tema ao qual o Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo vai dedicar um novo centro de estudos e atividades, o Museu da Tolerância, com arquitetura assinada por Juliana Corradini e José Eduardo de Souza Alves. No último dia 24 de setembro, o projeto arquitetônico foi apresentado ao público.

Após ser concebido conceitualmente, o futuro Museu da Tolerância da USP começou a ganhar seus contornos físicos a partir de um concurso público nacional para a criação de um projeto arquitetônico, evento organizado pelo IAB – Instituto de Arquitetos do Brasil, que mobilizou reconhecidos escritórios de arquitetura. Saiu vencedora a idéia arrojada de Juliana Corradini e José Eduardo de Souza Alves que expressa em ousado edifício os objetivos da nova instituição.

No comando do escritório Frentes Arquitetura, os profissionais formados pela FAU-USP acumulam experiência em projetos dessa natureza e colecionam importantes premiações. Inclui-se aí a proposta para a transformação do Elevado Costa e Silva (Minhocão), já detentora do Prêmio Prestes Maia de Urbanismo e do 1º. Prêmio da Exposição Nacional dos Arquitetos da 7ª. Bienal Internacional de Arquitetura.

Liberdade, tempo, espaço

Em relação ao Museu da Tolerância, na defesa do projeto, os profissionais salientam que sua criação foi pensada para respeitar diferenças, fomentar discussão e reflexão, e servir como espaço interativo de contínuo ensino e aprendizagem. “Enquanto o grande vão em balanço celebra a liberdade e a audácia, as rampas e escadas cruzando o vazio simbolizam a “costura” de cicatrizes que dificilmente se fecham”, explicam. “Ao mesmo tempo, uma generosa e acolhedora área sombreada permitirá debates ao ar livre, sobre a grama, em contato com a natureza.”

O museu, que vai ocupar um terreno de 120 mil metros quadrados, localizado na avenida Professor Lineu Prestes e doado pela Reitoria da Cidade Universitária, terá cinco pavimentos. A planta inclui subsolo com auditório de 400 lugares e sala de cinema para 150 pessoas, além de instalações administrativas. A cobertura desse subsolo será um teto-jardim que manterá a característica original do terreno. No térreo, a grande praça coberta terá restaurante, café, recepção e loja. O edifício em balanço, livre de qualquer apoio, vai abrigar  salas de aula, biblioteca, centro de documentação, restauração e produção de material, além de dois andares reservados às galerias de exposição permanente do acervo e mostras temporárias.

Envolto internamente por vidro, o prédio receberá como proteção externa uma pele metálica vazada, exceto na fachada da biblioteca, onde os grandes panos de vidro permitirão a vista aberta para a mata do Instituto Butantã.

Com forma inusitada, monumental e leve, aberto, amplo e livre, sem imposições de acesso, o projeto é a própria representação do ideal de viver, experimentar e celebrar igualdades e diferenças. “Algo que se torna possível ao colocarmos em ação nossa capacidade de tolerância e o direito de poder escolher o que se quer ser, em qualquer tempo e espaço.”

Para formar opiniões

Comecemos pela definição do termo – Tolerância: 1. ato ou efeito de tolerar; indulgência, condescendência;  2. qualidade ou condição de tolerante; 3. tendência a admitir, nos outros, maneiras de pensar, de agir e de sentir diferentes ou mesmo diametralmente opostas às nossas.

É justamente o desrespeito ao terceiro significado que tem gerado os mais danosos e lamentáveis fatos da história, como as atrocidades da Inquisição e o Holocausto, entre tantos exemplos, muitos infelizmente recentes, de intolerâncias raciais, religiosas, sociais, culturais, pelo mundo afora.

E esse é o objeto de pesquisa e projetos do LEI – Laboratório de Estudos sobre a Intolerância, criado em 2002 pela FFLCH da USP, que conta com apoio de intelectuais do calibre de Sergio Paulo Rouanet, Celso Lafer, Arnaldo Niskier. A idéia do museu surgiu a partir das atividades do laboratório e do acervo de mais de 10 mil livros e cem mil documentos sobre a Inquisição (o segundo maior do mundo; o primeiro pertence ao governo de Portugal), a ser doado pela pesquisadora e professora Anita Novinsky. Idealizado pela docente e inspirado no Centro Simon Wiesenthal, de Los Angeles, como um espaço interativo e não apenas expositivo de documentos e fatos históricos passados, a entidade deverá estimular reflexões e atitudes dos visitantes, visando alertar as pessoas para os riscos da intolerância e incentivar a aproximação das diversidades culturais. Em resumo, o grande objetivo do Museu da Tolerância será o de sensibilizar e formar opiniões sobre direitos humanos.

Imagens: Frentes Arquitetura