A certeza de que coisas boas nos farão viver e não apenas existir

É de Mário Quintana, o notável poeta gaúcho, este texto chamado Esperança e que guardo com muito carinho desde há muito, numa gaveta. Daquelas cheias de papéis e recordações, que para os outros são quinquilharias e para nós, preciosas e doces lembranças. Achei-o justamente quando pensava no que faria como crônica de início deste ano de 2012.

“Lá bem no alto do décimo segundo andar do ano, vive uma louca chamada Esperança. E ela pensa que no momento em que todas as sirenas, todas as buzinas e todos os reco-recos tocarem, vai atirar-se em delicioso voo!

Ela será encontrada miraculosamente incólume na calçada e o mais fantástico: outra vez criança. E em torno dela, indagará o povo curioso “como é seu nome meninazinha de olhos verdes?” E ela, iluminando o olhar de sentido, lhes dirá devagarinho, bem devagarinho, para que não esqueçam: o meu nome é ESPERANÇA.

É lindo, não? E me faz lembrar também de Santa Tereza de Ávila, que dizia ser “a imaginação a louca da casa” e, assim, “a fonte de tudo aquilo que não ousamos desejar quando a razão toma conta dos nossos pensamentos”.

Que a todo momento e sempre, tanto a louca quanto a linda menininha de olhos verdes habitem corações e mentes, sem qualquer medo, vergonha ou pudor.

Que a imaginação, essa louca da casa, esteja livre para encher seus espaços mentais de sonhos, de liberação de ânsias, sem qualquer preocupação com desmedidas ou cautelas injustificáveis em nome da realidade. Sonhar talvez seja a única coisa que não pode ser reprimida ou policiada por uma sociedade que insiste em determinar o que devemos ser.

Que em seus lindos voos, nada se fracione, nada se quebre e que eles deixem vocês incólumes na individuação e na consciência de que a criatividade faz parte da nossa fé, em nós mesmos e no próximo.

E que haja, sempre e sempre, a firme certeza ainda que na projeção dos dias futuros, que coisas boas acontecerão, que pessoas à volta nos estenderão a mão e que somos capazes de olhar por nós com autoestima, autorespeito e autoconfiança, mesmo sabendo que em meio ocorrerão dores e dificuldades, impedimentos e transtornos.

Eis porque a louca e a menininha se chamam Esperança, essa claridade que se faz por entre nuvens sombrias, o dourado que ganha destaque no fundo marrom.

Em não havendo esperança, leitores e amigos, de pouco vale o viver, porque então nos faltará estímulo, vibração, um ar mais puro para se respirar. Viver no melhor sentido da palavra é ter esperança; senão é apenas existir.

Foto: Ivone Santos © I stop for photographs